Ações e instrumentos judiciais em prol da conservação ambiental e pela mitigação dos efeitos da crise climática foi o tema da oficina “Litigância Climática como estratégia de implementação do Código Florestal”, realizada pelo Observatório do Código Florestal (OCF) e pela Amigos da Terra – Amazônia Brasileira (AdT) no dia 28 de fevereiro. O evento foi realizado com apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS).
O objetivo do evento foi discutir a responsabilização civil do dano climático pelo desmatamento em imóveis rurais, em especial quanto à falta de adequação ambiental desses imóveis à legislação de proteção florestal.
O evento foi dividido em duas mesas temáticas: Responsabilização do dano climático pelo desmatamento em imóveis e Instrumentos para o aprimoramento e a efetividade das ações judiciais por dano causado pelo desmatamento ilegal.
Na primeira mesa, o assessor jurídico do Instituto Socioambiental (ISA), organização membro da rede do Observatório do Código Florestal, Maurício Guetta ressaltou a importância do papel das políticas públicas, dos tomadores de decisão e da sociedade civil para a devida implementação do chamado ‘litígio estratégico’, ou seja, das ações judiciais em prol do meio ambiente.
“Os temas que perpassam o meio socioambiental são muitos e de difícil assimilação do meio judicial. Ao passo que essas ações judiciais também têm efeitos sobre as políticas públicas”, comentou.
Em 2020, a sociedade civil organizada passou a apoiar com maior ênfase os órgãos competentes para o ajuizamento de ações de controle concentrado em relação a políticas públicas que deixavam de ser aplicadas desde 2019, como é o caso do Fundo Amazônia. Neste caso específico, a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 59, resultou na reativação do mecanismo financeiro no dia 1º de janeiro de 2023.
Na mesma mesa, a promotora de justiça do Ministério Público do Pará, Eliane Moreira apontou problemáticas para a litigância climática no estado. A especialista demonstrou a falta de estrutura como causa limitadora da efetividade das ações – como exemplo, citou a falta de fiscais efetivos e aposta de fiscais temporários na fiscalização de infrações ambientais no estado.
Outras questões apontadas pela promotora foi a desarticulação de órgãos engajados no combate ao desmatamento no estado e também o gargalo de atos administrativos de comando e controle baseados em autodeclaração e não checados na cadeia madeireira.
Para além da área rural e florestal, a promotora também ressaltou a importância da consideração de impactos climáticos nos processos de licenciamento de aterros sanitários, passível de ajuizamento por Ação Civil Pública (ACP).
Ações coletivas são um dos meios para aplicação da legislação de proteção à vegetação nativa no Brasil, o Código Florestal, como mostro o juíz Emerson Moreira na discussão.
Para demonstrar a contribuição das decisões judiciais na implementação da lei, o juíz citou a admissão da existência de crises na implementação da lei, o fornecimento de novos conhecimentos e solidificação de conceitos para aprimoramento e o estabelecimento de diálogo entre os sistemas jurídico, político, científico e econômico, dentre outras.
Um dos desafios para a efetividade das ações judiciais atuais é a quantificação de dano climático, ou seja, o dano ambiental proveniente de desmatamento ilegal. Por isso o Instituto de Pesquisas Ambientais da Amazônia (Ipam) em parceria com o Ministério Público Federal (MPF) desenvolveu uma ação pioneira no país ao retratar as ações civis públicas (ACPs) apresentadas sobre reparação de danos causados por desmatamento ilegal na Amazônia.
Nessas ações, são calculados danos materiais relacionados às emissões de carbono geradas pelo desmatamento, nas ocasiões em que a atividade de desmate é necessariamente proibida – como em áreas protegidas.
Para o teste da tese, foi escolhida uma área que compõe o território tradicional de extrativistas de castanha no estado do Amazonas. Foi o primeiro caso de litigância climática fundado em danos climáticos na Amazônia Brasileira, de acordo com o Ipam. A iniciativa venceu o XI Prêmio da República na categoria “Combate ao crime e a outros ilícitos”.
INSTRUMENTOS PARA EFETIVIDADE DAS AÇÕES
São variados os exemplos de contribuições da sociedade civil e da academia para litigância climática e elaboração de políticas públicas na área. Foi o que mostrou Débora Assis, do Centro de Inteligência Territorial (CIT) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) na mesa ‘Instrumentos para o aprimoramento e a efetividade das ações judiciais por dano causado pelo desmatamento ilegal’.
O grupo realiza o trabalho de modelagem do Código Florestal e que permite extrair o balanço ambiental, com áreas das propriedades rurais, número, vegetação nativa, excedente ambiental em Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reserva Legal (RL), déficit ambiental em APPs e RL e área exigida para cada propriedade.
Os pesquisadores também são responsáveis pelo Panorama do Código Florestal, ferramenta desenvolvida no âmbito do Observatório do Código Florestal e que mostra o status dos imóveis, com condições de análise, desmatamento pós-2008 e dados de fiscalização, como Autorizações de Supressão Vegetal (ASV).
A Promotora de Justiça da 1ª Região Agrária do Pará e uma das participantes da mesa, Ione Nakamura, ressaltou a importância de sistemas de detecção de degradação ambiental como o Mapbiomas Alerta e o Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) e atentou às três diferentes esferas de responsabilidade ambiental no caso de desmatamento: o cível, para reparar danos, o criminal, para apurar o crime e a administrativa, para apurar infração administrativa.
A fim de aprofundar o debate sobre essa responsabilização, a especialista ressaltou a importância do entendimento de que o Código Florestal serve e deve servir a todas as pessoas e que isso deve ser aprimorado na aplicação da lei. Como exemplo, citou os povos e comunidades tradicionais. “Que devem estar sempre inseridos nesse debate”, comentou.
Representante da Advocacia Geral da União (AGU), Micheline Neiva finalizou a oficina debatendo soluções possíveis para os desafios encontrados e discutidos ao longo do evento.
A oficina completa pode ser conferida no link: https://www.youtube.com/watch?v=X4csmHqJBsg
Sobre o Observatório do Código Florestal
Rede de mais de 40 organizações da sociedade civil criada para promover o controle social da implantação da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 (Lei de Proteção da Vegetação Nativa do Brasil) e garantir integridade ambiental, social e econômica às florestas em áreas privadas.
Sobre a Amigos da Terra – Amazônia Brasileira (AdT)
A Amigos da Terra – Amazônia Brasileira (AdT) é uma organização não-governamental brasileira sem fins lucrativos com 30 anos de atuação na área socioambiental. Trabalha na promoção de iniciativas sustentáveis que visem o desmatamento zero nos habitats naturais brasileiros, com foco prioritário, mas não exclusivo, na Amazônia.
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