Brasília, 7 de agosto de 2015 – O Instituto Socioambiental (ISA), a Mater Natura, a Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda) e a Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), que representa mais de 120 organizações de 17 estados, serão parte nas quatro ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a Lei 12.651/2012, que revogou o antigo Código Florestal. As ações foram apresentadas pela Procuradoria Geral da República (PGR) e o PSOL.
Nesta quarta (7), o ISA encaminhou ao tribunal uma manifestação conhecida como amici curiae, pela qual passa a integrar o processo e lista argumentos em defesa das ADIs. Também assinam o documento Mater Natura, a Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda) e a Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA).
As quatro entidades ambientalistas também encaminharam ao ministro relator, Luiz Fux, pedido para que as ADIs sejam julgadas com urgência por causa dos impactos negativos da nova lei. Argumentam que ela estimula o desmatamento e impede a recuperação de áreas de preservação permanente (APPs) às margens de nascentes e rios. Segundo os cientistas, a destruição dessa vegetação é responsável pelo agravamento da crise hídrica e energética.
As ADIs pedem a anulação dos dispositivos da nova lei que anistiaram produtores rurais que desmataram ilegalmente APPs e reservas legais (RLs) até julho de 2008. Segundo estimativa publicada na revista científica Science, a área desmatada que deveria ter sido reflorestada, segundo a antiga legislação, foi reduzida, com a nova lei, de 50 milhões de hectares para 21 milhões de hectares, uma queda de 58% do passivo ambiental dos imóveis rurais no Brasil.
O amici curiae traz um amplo levantamento de dados científicos recentes que demonstram a importância para a população e a economia brasileiras dos serviços socioambientais prestados pela vegetação nativa. A pesquisa lembra que as APPs são fundamentais para evitar a erosão e o assoreamento de corpos de água, prevenindo enchentes e inundações, garantindo a quantidade e a qualidade dos mananciais de água e a produtividade agrícola. Conforme vêm alertando vários pesquisadores, as matas de beira de rio deveriam ser ampliadas, e não reduzidas, como fez a nova legislação.
“As ADIs do Código Florestal são as ações judiciais de maior relevância para a pauta ambiental da história, já que impactam diretamente a proteção florestal brasileira”, afirma Maurício Guetta, advogado do ISA responsável pela manifestação. “Há questões nesse processo sobre as quais o STF se pronunciará pela primeira vez, tornando este caso emblemático em termos de evolução da jurisprudência. Por isso, apresentamos agora ao STF a compilação dos estudos jurídicos e técnico-científicos sobre o tema, de modo a municiar os ministros dos elementos necessários para o julgamento.”
O documentário “A Lei da Água – Novo Código Florestal”, dirigido por André D’Elia e coproduzido por Fernando Meirelles, foi anexado à petição. O filme mostra a importância das florestas para a conservação dos recursos hídricos no Brasil e aponta alguns dos principais impactos da Lei 12.651.
Crise hídrica
A entrada das organizações ambientalistas no processo ocorre depois de o ministro do STF Luiz Fux notificar, no dia 11 de junho, os governadores dos quatro estados do Sudeste, afetados pela crise hídrica, para que estabeleçam planos e metas de restauração das APPs com parâmetros mais rigorosos do que os definidos pela lei vigente com o objetivo de mitigar e prevenir os problemas causados pela crise. A notificação reconhece a relação direta entre escassez de água e desmatamento e foi provocada por um ofício apresentado pela Frente Parlamentar Ambientalista no âmbito das ADIs com base em um dispositivo da própria Lei 12.651.
Restam apenas 21% da cobertura florestal nativa na área da bacia hidrográfica e dos mananciais que compõem o Sistema Cantareira, centro da crise no abastecimento de água que assola São Paulo, segundo informações da Fundação SOS Mata Atlântica. Dos cinco mil quilômetros de rios que formam o sistema, apenas 23,5% contam com vegetação nativa em área superior a um hectare em seu entorno. Outros 76,5% estão sem matas ciliares, em áreas alteradas, ocupadas por pastagens, agricultura e silvicultura, entre outros usos.
Na Bacia do Rio Paraíba do Sul, que abarca municípios de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro e é uma das principais fontes de água do Sudeste, a situação não é muito diferente, já que somente 26,4% da região contém cobertura vegetal natural. Dos 42,6 mil quilômetros de rios mapeados na bacia, apenas 17,8% têm áreas com cobertura florestal superior a um hectare. Outros 82,2% estão em áreas “alteradas”.
Organizações da sociedade civil, como aquelas que integram a Aliança pela Água, criticam o governo de São Paulo pela falta de transparência no tema e por privilegiar grandes obras bilionárias para combater a crise hídrica, e não ações de proteção e recuperação dos mananciais de água, como seu reflorestamento. Enquanto isso, os principais reservatórios da cidade de São Paulo seguem em nível crítico na comparação com anos anteriores.
Em junho do ano passado, o governo paulista lançou o Programa de Incentivos à Recuperação de Matas Ciliares e à Recomposição de Vegetação nas Bacias Formadoras de Mananciais de Água. A ação teve poucos resultados concretos até agora. Os plantios já realizados são pequenos e pontuais, na avaliação de Malu Ribeiro, coordenadora da Rede das Águas da Fundação SOS Mata Atlântica.
“Houve um avanço que seria mais institucional. Estamos ainda no desafio de vencer a etapa burocrática e dos processos administrativos para iniciar o processo efetivo de restauração florestal”, afirma Ribeiro.
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