O Congresso Nacional arrisca uma investida contra o meio ambiente e a população brasileira nos últimos meses com o avanço na tramitação e votação de projetos com flexibilizações graves às principais legislações e regras de proteção ao meio ambiente no Brasil: o Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) e o licenciamento ambiental.
Nessa semana, nos dias 7 e 8 de maio, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal pauta dois projetos com graves ameaças ao Código Florestal, legislação de proteção da vegetação nativa do Brasil, adiadas por retirada de pauta nas últimas semanas. A qualquer momento, ainda, o Senado Federal pautar uma medida que flexibiliza de forma grave o licenciamento ambiental do país.
PL 2168/2021: Irrigação em APPs
Onde: Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados
O que: O projeto de lei propõe o enquadramento de obras de infraestrutura de irrigação e dessedentação animal como atividades de “utilidade pública”, uma das exceções para a supressão de vegetação nativa das APPs previstas pelo Código Florestal, junto de interesse social e baixo impacto ambiental.
Autoria: José Mario Schreiner (União)
Impactos: Dentre os diversos serviços ecossistêmicos promovidos pelas APPs levantados, especialistas mostraram que a integridade delas, ou seja, a manutenção da vegetação nativa, contribui diretamente na diminuição de efeitos erosivos e de impactos decorrentes da perda de solo fértil, processo que provoca prejuízo de produtividade e renda no campo.
As obras de irrigação também resultam no proliferamento de represamentos ao longo dos rios e cursos d’águas, o que impacta diretamente na qualidade e disponibilidade das águas, agravando conflitos por recursos hídricos.
PL similar no Senado: Em dezembro de 2023, foi aprovado no Senado Federal o projeto de lei nº 1282/19, que libera a construção de reservatórios para projetos de irrigação em APPs. De autoria do senador Luis Carlos Henze (PP-RS), a medida deve ainda ser apreciada pela Câmara dos Deputados.
“Rios que eram de corredeira e de velocidade viram águas paradas e há um impacto grande na qualidade dessas águas. Isso altera todos os ecossistemas e perde biodiversidade, perde a qualidade da água e, com isso, perde a possibilidade de usos múltiplos da água. Portanto, é um projeto de lei equivocado e que beneficia um usuário em detrimento de todos os outros usuários da água das bacias hidrográficas brasileiras”, avalia Malu Ribeiro, diretora da SOS Mata Atlântica.
Nota técnica OCF e Observatório das Águas: “Obras de irrigação em áreas de preservação permanente: utilidade pública para quem?”
Posicione-se e vote “Discordo totalmente” no site da Câmara dos Deputados.
PL 3334/2023: Diminuição de Reserva Legal na Amazônia
Onde: Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal, quarta-feira (07), às 9h30
O que: O projeto permite a redução da Reserva Legal em áreas de florestas da Amazônia Legal nos municípios com mais 50% do seu território ocupado por áreas protegidas de domínio público. A medida retira a exigência do estado ter Zoneamento Ecológico-Econômico aprovado como requisito para a redução da Reserva Legal; passa a considerar áreas de domínio de forças armadas para cômputo dos 50% de áreas protegidas e estabelece prazo máximo de seis meses para que os Conselhos Estaduais de Meio Ambiente se manifestem acerca da redução da Reserva Legal.
Autoria: Senador Jaime Bagattoli (PL/RO)
Impactos: Uma análise mostrou que menos 89 municípios da Amazônia Legal se enquadram na categoria abrangida pelo projeto. Destes, 74 estão inteiramente no bioma Amazônia. Além disso, o levantamento também identificou que três estados da região Amazônica possuem mais de 50% de suas terras cobertas por UCs de domínio público e TI homologadas: Amapá, Amazonas e Roraima. Dos 74 municípios mencionados, 36 deles estão nestes três estados, o que significa que a área impactada pelo projeto soma esses e mais 38 municípios de outros estados. A área cadastrável identificada nessas localidades soma 28,4 milhões de hectares. Considerando o percentual de 80% de Reserva Legal, a área protegida deveria ser de 22,7 milhões de hectares. Com a redução para 50% caso o projeto seja aprovado, entretanto, a área protegida cai para 14,2 milhões de hectares. Ou seja, a medida coloca mais de 8,5 milhões de hectares de vegetação nativa sob risco.
“Num momento tão importante em que ações de combate ao desmatamento e proteção da Amazônia voltaram a ser prioridade da agenda brasileira, o PL 3.334/2023 vai na contramão de todos esses esforços. Permitir novos desmatamentos no bioma é injustificável e extremamente grave. Não é esse o modelo que devemos buscar para a região, e não pode ser esse o sinal do Congresso Nacional para as reuniões do G20 e da COP30 que acontecerão no país, em que o tema ambiental será um pilar fundamental das discussões”, avalia Marcelo Elvira, assessor de advocacy e políticas públicas do Observatório do Código Florestal.
Nota técnica OCF: PROJETO DE LEI Nº 3.334/2023
Nota técnica WWF: PROJETO DE LEI Nº 3.334/2023 – RESERVA LEGAL EM ÁREAS DE FLORESTAS DA AMAZÔNIA LEGAL
Posicione-se e vote “Não” no site do Senado Federal.
PL 364/2019: Ameaça a campos e vegetações não florestais
Onde: Aprovado na CCJ/Câmara dos Deputados, texto deve ser votado na Senado Federal
O que: transforma formas de vegetação nativa ‘predominantemente não florestais’, como campos gerais, campos de altitude e campos nativos, em áreas rurais consolidadas, uma categoria prevista pelo Código Florestal que permite exploração da área mediante comprovação de uso antrópico anterior a 22 de julho de 2008.
Impactos: a matéria coloca sob risco 48 milhões de hectares de vegetações não florestais no Brasil. De acordo com análise da SOS Mata Atlântica, a medida aprovada na comissão impacta 50% do Pantanal (7,4 milhões de hectares), 32% dos Pampas (6,3 milhões de hectares) e 7% do Cerrado (13,9 milhões de hectares), além de quase 15 milhões de hectares na Amazônia.
“Com o falso argumento de que nenhuma árvore será derrubada com essa flexibilização legal, os parlamentares favoráveis ao projeto renegam a importância dos campos nativos ao considerar essas áreas estratégicas para segurança hídrica, climática e da biodiversidade, como áreas consolidadas aptas para conversão agrícola sem a necessidade de licenciamento e recuperação ambiental”, aponta nota da SOS Mata Atlântica.
Nota técnica SOS Mata Atlântica: Impactos ambientais decorrentes da aprovação do PL 354/19 e possibilidades de solução
Posicione-se e vote “Discordo totalmente” no site da Câmara dos Deputados
PL 2159/2021: Desmonte do licenciamento ambiental
Onde: Comissões de Meio Ambiente e de Agricultura do Senado Federal
O que: O projeto de lei estabelece novas normas para licenciamento de atividade ou de empreendimento utilizador de recursos ambientais com alto potencial de degradação ambiental
Impactos: Apelidado de “PL da Devastação”, na prática o PL dispensa a maioria dos licenciamentos ambientais do país. Se aprovado, a maior parte dos empreendimentos e atividades econômicas precisaria apenas realizar um procedimento autodeclaratório na internet, sem nenhum tipo de análise prévia dos órgãos ambientais, e sua licença seria emitida automaticamente – a chamada Licença por Adesão e Compromisso (LAC).
“O PL 2.159 vai provocar o descontrole geral de empreendimentos geradores de impactos ambientais, como o desmatamento e a poluição. É a maior ameaça atual contra o meio ambiente, a saúde e a segurança da população no país. Precisamos evitar esse retrocesso histórico”, diz Mauricio Guetta, consultor jurídico do Instituto Socioambiental (ISA).
Notas técnicas: Estudos e notas técnicas
Posicione-se e pressione contra a proposta na página pldadevastacao.org.
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