À beira do rio Uruari, um dos braços do Amazonas, Pedro Gomes Mourão aguarda maior volume de trabalho numa das sete serrarias que operam com licença estadual no Assentamento Agroextrativista Ilha Grande de Gurupá, no Pará. Pedro depende de planos de manejo da floresta para poder cortar madeira numa região onde há centenas de serrarias funcionando clandestinamente.
Próximo à rodovia BR-163, que liga Cuiabá (MT) a Santarém (PA), região de alta de desmatamento em 2013, assentados reclamam da demora para aprovar planos de corte seletivo de árvores – o chamado manejo florestal. O maior assentamento tradicional do Pará, diferentemente da maioria dos assentamentos de reforma agrária nesta categoria, ainda registra grande percentual de floresta em pé.
As duas situações no Pará ganharam prioridade na nova agenda encampada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A exploração sustentável da madeira remanescente está entre os desdobramentos de um acordo celebrado em agosto com o Ministério Público Federal para regularizar a situação ambiental dos assentamentos, que já foram conhecidos como vilões do desmatamento da Amazônia e voltaram a registrar 12,6% de aumento do ritmo das motosserras no período entre agosto de 2012 e julho de 2013 – percentual inferior ao aumento de 28% registrado na região amazônica.
Essa nova agenda mira nas reservas florestais dos assentamentos, estimadas em 17 milhões de hectares, segundo Carlos Sturm, coordenador geral de Meio Ambiente e de Recursos Naturais do Incra. A área de reserva florestal equivale a mais de 100 vezes o tamanho da cidade de São Paulo. Ou ainda à metade da área total dos 2.400 assentamentos de reforma agrária na Amazônia.
Veja mais fotos aqui. “Temos exata noção da pressão por ativos florestais pelo mercado madeireiro, que funciona, em grande parte, na ilegalidade”, pondera Sturm. Para o Incra, a aprovação de planos de manejo florestal nos assentamentos, sejam extrativistas, sustentáveis ou tradicionais, poderia conter o desmatamento ilegal.
A proposta do instituto é promover parcerias público-privadas para a exploração da madeira nos assentamentos de reforma agrária. As empresas entrariam no negócio para bancar o investimento necessário ao inventário das florestas e à elaboração dos planos de manejo, já que o Incra não dispõe de assistência técnica para fazer esse trabalho. Os assentados ficariam com parte dos ganhos. Os contratos das empresas com as comunidades, segundo Sturm, devem prever auditorias externas: “Precisamos regular a relação entre empresas e as comunidades”. “É o único caminho no caso dos assentamentos que detém ativos florestais”, insistiu.
A agenda florestal defendida pelo Incra representa uma das frentes de atuação do Plano de Prevenção, Combate e Alternativas ao Desmatamento Ilegal em Assentamentos da Amazônia, conhecido pelo nome de Programa Assentamentos Verdes. Esta agenda está associada à regularização ambiental dos assentamentos. O compromisso assumido pelo instituto com o Ministério Público é fazer a adesão dos assentamentos de reforma agrária ao Cadastro Ambiental Rural (CAR) no prazo de um ano, contado a partir da edição de uma Instrução Normativa pelo Ministério do Meio Ambiente, prevista para ocorrer até janeiro de 2014.
A lei do Código Florestal prevê a possibilidade de prorrogação por mais um ano do prazo para o cadastramento dos imóveis rurais e posses. “Não podemos contar com essa prorrogação”, observa Sturm.
Passivo ambiental
A estimativa da reserva florestal dos assentamentos foi feita pelo Incra antes mesmo de o instituto ter uma noção exata dos passivos de Reserva Legal – e sobretudo de Áreas de Preservação Permanente – a serem compensados ou recompostos por força do Código Florestal. Esse cálculo depende do processo de cadastramento e regularização ambiental das terras. Estudo divulgado no segundo trimestre de 2013 pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) afirma que o passivo ambiental dos assentamentos caiu cerca de 95% com o novo Código Florestal. A redução ocorreu porque a nova lei dispensou imóveis de até quatro módulos fiscais da obrigação de recompor a Reserva Legal.
O estudo intitulado “O Novo Código Florestal e os Assentamentos na Amazônia” levou em consideração 1.868 assentamentos localizados no bioma amazônico, onde 80% da área total dos imóveis rurais precisam ser Reserva Legal. “Estima-se que cerca de 4,8 milhões de hectares ou a terça parte da área desmatada dentro dos assentamentos na região deixaram de ser passivo de Reserva Legal”, revela o estudo.
O Ipam calcula em 236,5 mil hectares (2.365 km²) o passivo de Reserva Legal a ser recuperado ou compensado, com base no desmatamento registrado depois de 2008, que o Código Florestal não legalizou. A contabilidade não levou em conta os desmatamentos ocorridos nos dois últimos aos. O mesmo estudo estimou em pouco mais de 20 milhões de hectares o estoque total de florestas dos assentamentos da Amazônia. Em relação ao passivo de Reserva Legal, o Incra investe na alternativa de compensação de Reserva Legal (RL) em Unidades de Conservação (UCs) prevista no código. Em Rondônia, a Secretaria de Desenvolvimento Ambiental (Sedam) aprovou a proposta do Incra de usar 445 mil hectares de terras que pertenciam ao Instituto e foram destinadas à criação de um Parque Nacional e duas Reservas Extrativistas para compensar a RL de 18 Projetos de Assentamento (PAs) no estado.
A proposta havia sido aceita pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que é o gestor das UCs federais, desde 2011. O passivo de Áreas de Preservação Permanente (APPs) segue indefinido, e o Incra informa que está em busca de financiamento para a recuperação ambiental das margens de rios, por exemplo. “O Incra precisa ter uma estratégia clara e acordada para regularizar os assentamentos e evitar que médios e grandes produtores tentem se beneficiar da flexibilização em assentamentos arrendando áreas recém desmatadas ilegalmente”, defende André Lima, Assessor Especial do IPAM. “Falhas nesta estratégia podem estimular o aumento nos desmatamentos ilegais,” alerta.
Assentados na floresta
O assentamento PA-Moju I e II, o maior do Pará e um dos maiores da Amazônia, é uma exceção entre os projetos tradicionais de reforma agrária na região. Diferentemente da maioria dos assentamentos, que já começaram com boa parte da área (quase 40%, em média) desmatada e mantiveram ritmo alto de corte de árvores, o PA-Moju ainda detém grande reserva florestal. “Nosso desafio é manter essa cobertura”, diz o assentado Jarbas Batista Serra, presidente de uma das comunidades do PA-Moju.
Há 12 anos na área, ele desmatou menos de 20% do seu lote – o suficiente, segundo ele, para viver com a mulher e os seis filhos. “Mas tem gente que vem para cá e não sabe plantar mandioca nem fazer farinha, muitos se acomodam”, relata. No Moju, há lotes desocupados, lotes abandonados e extração ilegal de madeira. E muitos assentados apostam na possibilidade de explorarem o muito que ainda resta de floresta nos lotes próximos da BR-163, com o apoio do Incra.
No assentamento extrativista Ilha Grande de Gurupá, no município vizinho a Melgaço, que registra o menor Índice e Desenvolvimento Humano (IDH) no país, a expectativa com a possibilidade de exploração madeireira também é alta. O sindicato dos trabalhadores rurais extrativistas de Gurupá estima que existam 600 serrarias em funcionamento na região com madeira extraída de forma clandestina. O maior problema, porém, é o avanço dos madeireiros na região. “Estamos vulneráveis a quem oferece renda”, diz Manoel do Carmo de Jesus Pena, uma liderança local. A renda, no caso, pode se resumir a R$ 50 por árvore cortada. “O assédio é grande”, disse.
Desmate em Assentamentos – Observatório do Código
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