Linha do tempo do desmatamento apresentada pelo último estudo do MapBiomas reflete mudanças nas orientações políticas ao longo dos anos.
Um levantamento divulgado na última quinta-feira (31) pelo Mapbiomas, apontou que o Brasil perdeu 96 milhões de hectares de vegetação nativa entre 1995 e 2022. A redução de 75% para 64% de florestas nativas, nos últimos 27 anos, em todos os biomas brasileiros, equivale a perda de 2,5 vezes o tamanho da Alemanha.
Só no Bioma Amazônia foram perdidos para uso alternativo da terra 52 milhões de hectares, desde 1995. Segundo o Mapbiomas, aproximadamente um terço de todo território nacional é ocupado pelo setor agropecuário, e na Amazônia esse setor ocupa 98% da área desmatada.
O estudo ainda revela uma linha do tempo, na qual a maior taxa de desmatamento da história concentra-se no início do período estudado — de 1995 a 2007. Também indica que nos últimos 10 anos (2013 a 2022) a perda de vegetação nativa no Brasil vem acelerando. Contudo, a informação mais preciosa remete ao período de 2008 a 2012, quando houve uma redução significativa nas taxas de desmatamento. O que aconteceu nesse período? Como o país conseguiu esse resultado expressivo? Por qual motivo voltou a crescer e o que é preciso para reduzir novamente essas taxas?
Gráfico apresentado no lançamento do Mapbiomas
No Livro “Uma Breve História da Legislação Florestal Brasileira”, lançado pelo Observatório do Código Florestal, é possível encontrar algumas dessas respostas. Segundo os autores, os anos de 2008 e 2009 são marcados pela criação de duas políticas importantes: o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), o Plano Amazônia Sustentável (PAS), em 2008, e a Política Nacional da Mudança do Clima (PNMC – Lei nº 12.187), em 2009. Além disso, foram investidos cerca de US$1 bilhão por ano para a conservação e fiscalização ambiental. Paralelamente, a taxa de desmatamento na Amazônia caiu de 27.772 km2 em 2004 para 4.571 km2 em 2012, segundo dados do Inpe.
As tentativas de enfraquecer o Código Florestal não avançaram no Congresso por falta de apoio político do Poder Executivo, com articulação de Marina Silva à frente do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Mesmo após a sua saída, tanto Carlos Minc quanto Isabela Teixeira, que a sucederam, obtiveram resultados ambientais significativos, com destaque a redução do desmatamento ao mínimo histórico em 2012. A vontade política era clara e poderosa para conter a perda da vegetação nativa.
Mas o cenário promissor à proteção florestal, contudo, começou a despertar fortes reações do setor do agronegócio e os governos Rousseff (2010-2016) e Temer (2016-2018) voltavam-se aos interesses desse grupo econômico. O resultado foi a publicação do novo Código Florestal de 2012. Os impactos da mudança da Lei foram substanciais, com redução de 58% da área desmatada ilegalmente a ser restaurada. Comprovada a possibilidade de reduzir a proteção legal das florestas, nem a meta ambiciosa de redução de emissões de gases de efeito estufa para o Acordo de Paris em 2015 foi capaz de estancar o desmatamento. A vontade política passou a ser machado.
Desde então, os números do Mapbiomas demonstram que nos últimos dez anos o desmatamento voltou a crescer. A aceleração da perda da vegetação nativa se contrapõe ao pé no freio da implementação do Código Florestal.
Somada à expectativa de novas flexibilizações da legislação, a morosidade do Código Florestal é o reflexo da falta de compromissos políticos dos governos federal e estaduais na fiscalização e na implantação da Lei, que integra inúmeros obstáculos reais ou inventados para a defesa dos interesses de uma minoria.
Para evitar cenários irreversíveis, como o ponto de não retorno da Amazônia, é preciso inverter o ritmo do avanço do desmatamento versus cumprimento da Lei de Proteção da Vegetação Nativa do país. É mais do que urgente dissolver os obstáculos e alavancar mecanismos que permitam acelerar a implantação da Lei para frear, de uma vez por todas, o desmatamento.
Roberta del Giudice, secretária executiva do Observatório do Código Florestal
Colaboraram no texto Simone Milach e Anna Francischini
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