As sementes foram lançadas e o campo está mais fértil do que outrora. Impulsionados pelos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (os 17 compromissos assumidos pelos países para acabar com a pobreza, lutar contra as desigualdades e combater as mudanças climáticas, com foco em 2030), os negócios de impacto socioambiental estão em alta, e os investidores cada vez mais exigentes. Mercado de carbono, títulos verdes…Não faltam ferramentas para estimular o redirecionamento de rota, rumo a uma economia sustentável.
Coordenadora de Iniciativa no portfólio de Uso da Terra e Sistemas Alimentares, Paula Bernasconi foi
quem moderou o painel “Florestas: clima, água, biodiversidade e oportunidade de negócio”. Ela lembrou
que, passada uma década, a falta de implementação dos Programas de Regularização Ambiental (PRAs), o coração do Novo Código Florestal, acabou impactando instrumentos de incentivo, como as cotas de Reserva Legal e os pagamentos por serviços ambientais.
“Neste cenário sombrio, existem luzes que são trazidas por várias iniciativas que algumas instituições estão colocando em prática. Projetos e ações que mostram que o cumprimento do Código Florestal vale a pena e, longe de ser um problema, além de trazer benefícios sociais e ambientais, também pode ser uma grande oportunidade de negócio”, declarou. Também participaram do debate Tatiana Cneio Alves, diretora de Finanças Sustentáveis na The Palladium e gestora do Selva Founding, Pedro Moura Costa, co-
-fundador e presidente do conselho da BVRio, e Valmir Ortega, geógrafo e diretor-executivo da Belterra.
Desmatamento: um agravante do risco de crédito
A falta de regularização fundiária no país limita o desenvolvimento agropecuário brasileiro e impacta na análise de risco das instituições financeiras, afetando o desenvolvimento sustentável da região. A avaliação é de Tatiana Cneio Alves, diretora de Finanças Sustentáveis na The Palladium, uma consultoria de impacto internacional, com 55 anos de experiência e atuação em mais de 90 países. Este “ciclo perverso” tem, segundo ela, como principais causas a legislação que incentiva a apropriação privada de terras públicas, bases de dados desorganizadas, baixa transparência e desacordos entre órgãos estaduais e federais.
O resultado? Profunda concentração de terras, grilagem descontrolada, conflitos fundiários, especulação imobiliária e insegurança jurídica são alguns exemplos das consequências imediatas. “Ao mesmo tempo em que possibilita e estimula a grilagem, a ineficiência na administração fundiária alimenta o ciclo do desmatamento. Isso porque o menor acesso a crédito significa baixa produtividade e, consequentemente,
desmatamento”, sintetizou Tatiana, que também é gestora do Selva Founding. Ou seja: as principais causas que reduzem o acesso ao crédito são reforçadas pelas consequências geradas, criando um círculo vicioso negativo.
Depois de detalhar as etapas do processo de tomada de crédito, Tatiana falou sobre a importância da assistência técnica quando se trata do uso da terra e adequação ao Código Florestal. “A disponibilidade de crédito, juntamente com uma assistência técnica voltada para as principais barreiras encontradas pelos proprietários, é uma possível solução para dar escala aos financiamentos”, afirmou, chamando a atenção para a necessidade de se ter uma estrutura de assistência técnica específica para cada região. “No final
das contas, acho que o que a gente tem que fazer é isso: ajudar nessa nessa fase de transição. Está havendo uma mudança cada vez maior de mentalidade no Brasil para que as instituições financeiras olhem para a questão do uso da terra.”
Tirar as leis ambientais do papel
O Novo Código Florestal e a BVRio – Bolsa Verde do Rio de Janeiro nasceram praticamente juntos, com alguns meses de diferença. Talvez isso explique a afinidade entre ambos. A Lei 12.651/2012, aliás, marcou a estreia da organização que promove o uso de mecanismos de mercado para facilitar o cumprimento
de leis ambientais e apoiar a economia verde no país. “O Código Florestal é uma lei com potencial transformacional incrível para o setor rural, criando emprego, gerando mais sustentabilidade, atraindo mais investimento, vendendo serviços ambientais, melhorando a agricultura”, disse Pedro Moura Costa, co-fundador e presidente do conselho da BVRio.
Entretanto, a falta de vontade política para a implementação da lei coloca em xeque mecanismos que poderiam criar um mercado com potencial bilionário, conforme Costa. É o caso da chamada Cota de Reserva Ambiental, que, se regulamentada, permitiria a venda do excedente de floresta de uma
propriedade para outra, em busca de adequação. “Se todos os proprietários rurais estivessem engajados em comprar e vender cotas, teríamos um mercado de dezenas de bilhões de reais por ano”, disse, lembrando que foi a frustração diante de situações como esta que levou a BVRio procurar outras possibilidades de financiamento.
Entre tais alternativas que surgiram, está o Programa SIMFlor, lançado em 2022, numa parceria da BVRio com a Sustainable Investment Management (SIM) e a ecosecurites. Para promover a implementação do Código Florestal, a iniciativa dispõe de R$ 1 bilhão de reais para a aquisição de Cotas de Reserva Ambiental (CRAs) e remuneração dos serviços ambientais. “Se o Código Florestal fosse implementado na sua plenitude, isso resultaria no sequestro ou manutenção de estoques de carbono na ordem de 100 bilhões de toneladas de CO2 que seriam estocadas nessas áreas. Isso é um volume muito grande, o equivalente a 50 anos de emissões do setor industrial europeu”, comparou.
O negócio da restauração
Auxiliar na regeneração dos mais de 70 milhões de hectares de solos degradados no Brasil, criando arranjos e modelos de negócios que possam acelerar o processo de restauração, é a missão da Belterra Agroflorestas. “Foi olhando para esse desafio de como criar meios de fazer, de como apoiar os
agricultores, de como acelerar o engajamento da restauração florestal que a gente criou a Belterra”, contou Valmir Ortega, geógrafo e diretor-executivo da empresa.
Presente em cinco estados e três biomas distintos, a Belterra, por meio de contratos de parceria, integração ou arrendamento, já implantou florestas produtivas em mais de 2,2 mil hectares, e a meta é chegar a 40 mil até 2030. O próximo passo será o desenvolvimento de uma plataforma de restauração
que alcance centenas de milhares de hectares. “Para que, assim, junto com outras iniciativas, a gente crie oportunidades, coloque a agropecuária no outro patamar de sustentabilidade no Brasil e posicione o país, de fato, com um player relevante para a economia verde”, destacou.
Ortega, que trabalhou por mais de uma década em governos, comentou que um dos fatores que o motivaram a agir foi perceber que havia poucos negócios escalonáveis, o que coloca em risco o
cumprimento da meta brasileira no Acordo de Paris, de restaurar 12 milhões de hectares até 2030. Segundo ele, para engajar o produtor rural é crucial que a recuperação de passivos seja vista como uma oportunidade que, entre tantos benefícios, se traduzirá em produtividade.
Tempo de florescer
Não há dúvidas de que, apesar dos números alarmantes no desmatamento nos últimos anos, sopram ventos favoráveis. Esta é a conclusão dos participantes do painel organizado pelo Observatório do Código Florestal. “Estamos caminhando para um cenário onde o financiamento de coisas complexas como a conservação florestal e o uso sustentável do solo vai se tornar mais factível, escalável e acessível para aqueles que mais precisam”, projetou Pedro Moura Costa, da BVRio.
Painelistas
Paula Bernasconi – Coordenadora de iniciativa no portfólio de Uso
da Terra e Sistemas Alimentares / ICS (Moderadora)
Tatiana Cneio Alves – Diretora de Finanças Sustentáveis na Palladium e gestora / Selva Fund
Valmir Ortega – Geógrafo e Sócio / Belterra Agroflorestas
Pedro Moura Costa – Presidente do Conselho / BVRio
Assista ao debate na íntegra:
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