Na mesma semana em que mulheres do campo reivindicam o fim da violência contra mulher, uma das principais lideranças quilombolas do país é assassinada
18 de agosto – Mais de 100 mil mulheres do campo, floresta, das águas e cidade se reuniram em Brasília, nesta quarta-feira (16), para 7ª edição da Marcha das Margaridas. Com o tema “Pela reconstrução do Brasil e pelo bem viver”, as participantes apresentaram suas demandas; entre elas, poder e participação política das mulheres, proteção da natureza com justiça ambiental e climática e vida saudável com agroecologia e segurança alimentar e nutricional
A Marcha que acontece a cada 4 anos, sempre em agosto, leva o nome de Margarida Maria Alves, líder sindical brasileira que se destacou pela luta contra a exploração e abusos do trabalho no campo e em defesa dos direitos dos trabalhadores rurais. Margarida foi assassinada no dia 12 de agosto de 1983, a mando de fazendeiros da região onde vivia, gerando comoção nacional.
Reinvindicações
Com organização da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), o caderno com as pautas da marcha de 2023 foi entregue em evento que contou com a participação de 13 ministras e ministros de estado, no Palácio do Planalto, no dia 21 de junho.
As demandas foram divididas em 13 eixos políticos, sendo:
— Democracia participativa e soberania popular;
— Poder e participação política das mulheres;
— Vida livre de todas as formas de violência, sem racismo e sem sexismo;
— Autonomia e liberdade das mulheres sobre o seu corpo e a sua sexualidade;
— Proteção da natureza com justiça ambiental e climática;
— Autodeterminação dos povos, com soberania alimentar, hídrica e energética;
— Democratização do acesso à terra e garantia dos direitos territoriais e dos maretórios;
— Direito de acesso e uso da biodiversidade, defesa dos bens comuns;
— Vida saudável com agroecologia e segurança alimentar e nutricional;
— Autonomia econômica, inclusão produtiva, trabalho e renda;
— Saúde, Previdência e Assistência Social pública, universal e solidária;
— Educação Pública não sexista e antirracista e direito à educação do e no campo;
— Universalização do acesso à internet e inclusão digital.
Em discurso durante a marcha, o presidente da república Luiz Inácio Lula da Silva, assinou oito decretos direcionados a agricultura familiar, que de acordo com ele “convergem para a autonomia econômica e inclusão produtiva das mulheres rurais”.
Entre eles, um que dá preferência para famílias chefiadas por mulheres na fila para assentamento na reforma agrária. Outro decreto foi o do Programa Quintais Produtivos, voltado para a promoção da segurança alimentar e nutricional e da autonomia econômica das mulheres rurais.
Violência contra a mulher rural
A violência contra as mulheres do campo é um dos pontos centrais da Marcha das Margaridas. De acordo com Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, no último ano 1,9% dos feminicídios e 3,3% das demais mortes violentas de mulheres no Brasil ocorreram em regiões rurais do país.
Na última quinta-feira (17), apenas um dia depois da marcha, mais uma mulher se tornou vítima da violência rural. Bernadete Pacífico, uma das mais importantes líderes quilombolas do estado da Bahia, e coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq) foi assassinada a tiros com 72 anos, quando dois homens armados entraram no imóvel onde ela estava e efetuaram os disparos com arma de fogo
Bernadete Pacífico foi secretária de Promoção da Igualdade Racial de Simões Filho (BA) e liderava o Quilombo Pitanga dos Palmares, formado por cerca de 289 famílias, responsável por uma associação onde mais de 120 agricultores produzem e vendem farinha para vatapá, além de frutas e verduras. A Yalorixá Bernadete, como também era conhecida, lutava por esclarecimentos e solução em caso do assassinato do seu filho, Flávio Gabriel Pacífico, o Binho do Quilombo, assassinado em 2017.
Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) revelam que no primeiro semestre de 2022, 74 mulheres foram vítimas de violência em conflitos no campo. Entre as formas de violência mais frequentes estão ameaças de morte, intimidação e tentativa de assassinato.
Algumas violências contra a ocupação e a posse passaram a ser registradas pela CPT a partir de 2019, sendo uma delas a contaminação por agrotóxico, a omissão/conivência e o desmatamento ilegal.
O relatório também evidencia que quilombolas são as principais vítimas de humilhação no campo, sofrida sobretudo por pessoas do sexo feminino. Na maioria dos casos, ameaça de morte e intimidação representaram, respectivamente, 31,25% e 13,54% das violências sofridas por mulheres, seguidas de prisão (9%) e criminalização (8%). Mortes em consequência de conflitos (5%) ocupam a sexta colocação e tentativa de assassinato (5%) aparece na sequência.
Desigualdade
De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), as mulheres representam 45% da mão de obra agrícola em países em desenvolvimento, como o Brasil. Apesar de representarem pouco menos da metade de toda força no setor da agricultura, os dados mostram que as trabalhadoras e moradoras do campo enfrentam desigualdade social, política e econômica. Elas detêm a posse de 35% das terras, recebem 10% dos créditos e apenas 5% da assistência técnica.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2017, apontam que o número de mulheres a frente de propriedades rurais aumentou 38% em todo Brasil, entre 2006 e 2017. Apesar desse avanço, elas ainda são minoria entre os proprietários: no Brasil 19% dos estabelecimentos rurais têm mulheres como proprietárias.
Em entrevista ao portal de notícias, Agência Brasil, a assentada rural Alcimeire Rocha Morais conta que levou o filho de José Pietro, de 6 anos, para conhecer a capital do país e lutar pelo direito à terra. “A gente mora em assentamento. Ainda não tem a terra no nome, mas tem o círculo da terra onde pode trabalhar, criar as coisas da gente, fazer a roça. Só que não temos muita condição para cuidar da terra. Só plantamos as coisas boas e criamos os bichos: galinha, porco. Isso”
Já a agricultora Maria Francisca da Silva Alcântara, de Piranhas – Alagoas, parou os cuidados com a plantação de arroz e feijão para estar presente na Marcha das Margaridas. “Viemos buscar os projetos para as agricultoras que ficaram nas comunidades, para plantar as sementes sem orgânicos. É tudo sem veneno. Força, fé e coragem – essa é a receita para vencer batalhas.”
A agroecologia, uma das demandas das mulheres presentes na marcha, é uma forma de agricultura sustentável, que não danifica o solo e com o uso mínimo de produtos químicos, como agrotóxicos.
Texto: Anna Francischini
Edição: Aldrey Riechel
Imagem: Contag
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